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quinta-feira, 26 de maio de 2011

Noruega

Entro na Noruega a pensar que poderei ir até ao norte, fazendo de Larvik (onde cheguei) para sul, e depois fazendo a costa ocidental. Mas este, não é um país como os outros que encontrei, em variados aspectos…
Também aqui na Noruega tentei fazer o caminho 1 (para ciclismo e pedestre), mas perdia-me facilmente, pois esta sinalética é muito espaçada aqui na Noruega. Outro aspecto é que a sinalética me mandava fazer fora de estrada em montanha, o que se torna muito penoso para quem vai tão pesado, e quer de alguma forma ser mais rápido na progressão.
Depois tenho a sinalética própria do país, que me indica (sinal azul com uma bicicleta, e indicando a cidade para a qual me dirijo) um caminho alternativo à estrada principal, sem inicialmente saber o porquê (tive que aprender…), e não existindo inicialmente (só depois) sinalética a proibir os velocípedes. E entre seguir uma e outra sinalética, perdi-me várias vezes no dia a seguir à minha chegada, onde tive muita chuva, subidas…foi um dia mentalmente desgastante e em que só fiz 18 kms.
Então, nos dias a seguir sigo pelas estradas principais (nacionais e regionais), ao longo da costa (de Larvik para sul), fazendo mais de 100kms por dia durante vários dias(134kms num dos dias). Num dos dias, ignoro a sinalética que diz que os velocípedes deverão ir por outro caminho abandonando a estrada principal. Ignoro, até porque não existe o sinal de proibição. Subida pela montanha, passo por uma portagem sem portageiro e com câmaras de vigilância, e é então que vejo o sinal de proibição para velocípedes. Mas já tinha subido demasiado e não quis voltar para trás, e começo a passar por muitos túneis que furam a montanha, um deles com 3200m e que parece não ter fim. Circulo atrapalhadamente e vagarosamente por um passeio extremamente pouco largo (e daí a dificuldade em circular nele), para evitar ser abalroado pelas viaturas que circulam a alta velocidade, um barulho ensurdecedor… saio de um túnel, sinto-me aliviado, mas um vento forte… encontro-me agora numa ponte muito alta e que liga as 2 montanhas.  Um episódio a não repetir.
Este objectivo de chegar ao norte da Noruega, estava-me a retirar o gozo continuo pela viagem, estava a fazer muitos kms por dia e em condições com bastante desgaste como o declive, a chuva e o frio (altamente depressivos), as frieiras nas mãos e nos pés e a ausência do calor humano, não podia comprar muito leite ou chocolate no supermercado porque é muito caro(3 ou 4x mais caro)… passei a não gostar da Noruega, passei a  detestá-la na verdade.
Num dos dias de manhã, saí da tenda a chover, e arrumei a tenda que ficou também molhada por dentro. Fiquei furioso e comecei a falar alto contra o tempo: “chove, chove mais, chove, chove a sério, mais mais mais…” e comecei-me a rir de tudo aquilo, e passei de fúria a diversão! Mas esta era apenas uma emoção momentânea.
Tive que abandonar a ideia de ir até ao norte da Noruega, disse para mim que não estava certo detestar este país por causa do clima e da minha ideia de querer ir tão a norte, que estava a ser injusto, e passei a querer encontrar algum amor por este país. Até porque os noruegueses estavam a ser muito bons para mim: ofereceram-me os jardins das suas casas para acampar, coberturas evitando montar a tenda, jantar, pequeno almoço, lanche, meias de lã muito quentes, usar a sua internet…
A zona costeira, os rios, as montanhas, os Fjordes…tudo isto é lindo, e o clima é uma característica intrínseca à localização do país no globo, tive que aprender que era assim.
Após circular pela costa ocidental até à cidade de Sandnes, resolvo dirigir-me para o interior em direcção à Suécia. Visito Preikestolen, uma conhecida falésia com 604m, onde acampo junto à estrada e com sinal de proibição de acampar, existe parque de campismo e hostel. Faço-o mais um casal francês, que se encontra de carro e em Lua de Mel.
Esta rota que faço agora é também maravilhosa, vou em direcção a Rodal. Pergunto a várias pessoas sobre os túneis que se encontram assinalados no mapa, um deles muito grande. A maioria diz-me que existem túneis que os velocípedes podem passar mas que alguns poderão não ser iluminados , o que será necessário o uso do meu frontal. Quanto aos outros túneis, os maiores, existe estrada contornando a montanha e que em principio já não haverá neve.
Até agora tudo se estava a confirmar, era como me tinham dito…alguns túneis sem luz, contorno montanha no caso de túneis mais compridos. Continuo a subir, chove… e quando chego a um túnel com 5650m diz-me que os velocípedes têm que contornar a montanha pela estrada antiga, mas a estrada está coberta de neve, e é impossível circular.
Começa a ficar frio, muito frio, o tempo começa a piorar, devo estar próximo dos 1000m e resolvo montar a tenda em frente de uma casa na montanha, até porque bati às portas das casas e ninguém atendeu, experimentei abrir as portas mas estavam fechadas. Uma das casas tem um alpendre e zona cimentada em frente da porta, o que me parece fantástico inicialmente. Tenho as mãos geladas, chove granizo e cai alguma neve, monto a tenda com dificuldade mas com a determinação necessária à minha sobrevivência.
Já dento da tenda, o saco de cama aquece-me, agora estou melhor penso… o vento começa a soprar forte e a querer levar a tenda que não estava presa ao chão, o vento é tão forte que algumas vezes pensei que me ia levar a mim e à tenda. De braços abertos, tentando fixar ao chão os cantos da tenda do lado em que sopra o vento, observo a tenda a ser sacudida com violência. Os sacos de viajem encontram-se no exterior debaixo do avançado outros fora, mas são pesados, não voam. O meu casaco colocado em cima dos sacos de viajem que se encontram debaixo do avançado como normalmente faço, desaparece… Decido ir à procura dele, colocando alguns sacos de viagem no interior da tenda para ela não ir com o vento. Levo comigo o meu frontal (luz colocada na testa), o telemóvel e um papel com um número de telefone de um bombeiro que conheci (tendo imaginado ficar sem as minhas coisas, o telemóvel seria a minha última salvação). Encontro o casaco, na estrada em baixo.
Já tinha pensado em ligar ao meu amigo bombeiro que conheci, ou à emergência, mas pensei em testar as minhas capacidades de sobrevivência e “esticar a corda” até onde pudesse.
Penso que a tenda não é um lugar seguro, o vento é fortíssimo, e vou procurar alguma casa de gado, alguma arrecadação. Tento abrir uma pequena casa, a porta abre-se…estou salvo. Agradeço a Deus esta dádiva, tinha-lhe pedido que parasse a chuva e o vento, e parou para mim, porque estou abrigado.
A casa tem pouco mais de 20 metros quadrados, parece estar meio abandonada, está vazia, apenas com uma mesa, uma cadeira. A noite foi terrível, com muito vento e neve, o dia a seguir a mesma coisa…
Passo 2 dias nesta casa à espera que o tempo melhore, penso atravessar o túnel (com 5650m) durante a noite(embora esta opção me desagrade pela experiência anterior) quando houver menos trânsito, ou então vou pedir boleia a uma caravana.
Mas, a 400m vejo 2 homens a reparar um telhado de um centro de viaturas de limpa neves, vou ter com eles para lhes perguntar sobre a previsão dos próximos dias. Não ia melhorar… dão-me boleia no seu furgão para passar o túnel e poderei acampar no seu jardim.
Enquanto vamos no caminho, reparo que a neve diminui progressivamente até deixar de existir, e confirmamos todos que aquele lugar onde estava, era mesmo o pior. Percorremos 30kms.
2 romenos a trabalhar à 4 anos na Noruega, super abertos e simpáticos, oferecem-me o jantar em sua casa com a família de um deles. 2 crianças pequenas, uma mulher simpática, um jantar parecido com o de Portugal, gelado na sobremesa. Depois vem um norueguês e continuamos numa conversa animada.
Fico a dormir numa pequena casa de madeira, pronta a alugar no verão aos viajantes. 

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